Chamada de Contribuições para o Fórum “Antropologias contra-hegemônicas e dissidentes em contextos de descentramento epistêmico”

Organizadores: Cristhian Teófilo da Silva (UnB) e Estevão Rafael Fernandes (UNIR)

O que é um Fórum

Estamos aceitando contribuições para o Fórum “Antropologias contra-hegemônicas e dissidentes em contextos de descentramento epistêmico”, organizado por Cristhian Teófilo da Silva (UnB) e Estevão Rafael Fernandes (UNIR). Diferentemente do modelo de dossiês, constituídos por textos individualmente concebidos, o modelo de fóruns adotado por Novos Debates está estruturado em torno de textos que dialogam com o texto Problema proposto pelos seus organizadores. Este formato visa a promover conversas, discussões e controvérsias em torno de ideias e questões emergentes no campo antropológico contemporâneo. Portanto, os textos submetidos devem responder às questões levantadas pelo texto Problema (disponível aqui), contribuindo para o debate proposto pelos organizadores do Fórum.


A proposta

Ao propor uma “etnografia das antropologias periféricas” como abertura do Seminário Latino-Americano de Antropologia, realizado em Brasília em 1987, Roberto Cardoso de Oliveira (1988) visava uma abordagem mais consistente e coerente para interpelar o “SER”, epistemologicamente plural, da antropologia. Nesse sentido, Cardoso de Oliveira se valia da própria etnografia como instrumento para suscitar, de maneira controlada, a reflexividade sobre os distintos modos de se fazer antropologia ao invés de recorrer aos repertórios do movimento pós-moderno estadunidense, os quais corriam o risco, no limite, de incitar certo “interpretativismo”, entendido por ele como um desenvolvimento perverso do paradigma hermenêutico.

Sob os termos de uma “etnografia das antropologias periféricas” adotou-se uma concepção geográfica para articular os processos de desenvolvimento, cooperação e “amadurecimento” das comunidades de praticantes da antropologia em nível mundial em torno dos centros mais estabelecidos como a Inglaterra, França e Estados Unidos, responsáveis pela origem e consolidação dos paradigmas constitutivos da disciplina.

Esta primeira classificação geográfica das antropologias – que as subdividiam entre as antropologias herdeiras de “uma profunda tradição ocidental”, como as demais nações europeias; as nações asiáticas, “possuidoras de fortes e profundas tradições culturais letradas (como Japão, Índia e China)”; e as “novas nações” da América Latina, Caribe e África – tinha o objetivo de indicar o vínculo disciplinar das antropologias periféricas com relação às antropologias centrais. Entretanto, a reação a esta forma de qualificar as “antropologias do terceiro mundo” não foi bem recebida mundo afora, uma vez que o termo “periférico” sinalizava mais uma desqualificação da antropologia realizada fora dos centros metropolitanos mundiais. Assim, o projeto meta-etnográfico original foi reelaborado a favor de uma estilística da antropologia, o que inevitavelmente estimulou trabalhos sobre antropologias nacionais e suas comunidades de praticantes umbilicalmente ligadas aos centros epistêmicos metropolitanos.

Desse modo, a sensibilização para as tensões epistemológicas, éticas, estéticas e políticas decorrentes dos enquadramentos moderno/coloniais e de dependência das relações entre países centrais e periféricos, que estava presente na classificação original de Cardoso de Oliveira (ver Cardoso de Oliveira 1998 e Cardoso de Oliveira e Ruben 1995) cedeu lugar a trabalhos que valorizam seus vínculos com os saberes hegemônicos dos países centrais para sua própria constituição e institucionalização, uma vez que se servem destes mesmos vínculos para afirmar sua hegemonia em âmbitos nacionais e regionais.

Esta perspectiva promove olhares cruzados e transculturações conceituais importantes para manter a vitalidade da Antropologia, sobretudo dos estilos mais afeitos ao diálogo com os centros ainda hegemônicos da disciplina e por onde também ocorrem as trocas entre as antropologias ditas periféricas entre si. Como observado recentemente por Gustavo Lins Ribeiro: “É comum acreditar que somente as antropologias hegemônicas —fundadas na França, Inglaterra e Estados Unidos— conseguem exercer influência internacional” (2022: 140). Entretanto, como se sabe, existem: “(…) outras possibilidades de intercâmbio, trabalho em rede e fertilização cruzada dentro do sistema mundial de produção antropológica.” (idem)

Entendemos que estas perspectivas situadas na América Latina, em particular no Brasil, promovem um contraponto meta-antropológico perspicaz para dialogar com projetos hegemônicos de historiografia da teoria antropológica (ver a série de coletâneas organizadas por Stocking Jr.) e de etnografia do pensamento moderno (Geertz 1997). Entretanto, cabe perguntar onde estão, o que dizem, como são feitas outras antropologias, contra-hegemônicas, dissidentes e igualmente plurais? Que acionam outras referências epistêmicas/gnoseológicas e assentam suas percepções e elaborações intelectuais em outros “centros” simbólicos de enunciação antropológica.

Beatriz Martins Moura, por exemplo, publicou em maio de 2021 no portal Geledés – Instituto da Mulher Negra, um artigo intitulado: “Antropologias contra-hegemônicas: Uma virada no rumo das nossas referências”. Nele, ela conta ter se formado em Antropologia na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e realizado seu mestrado e doutorado na Universidade de Brasília (UnB). É a partir dessa formação que se tem enxergado a necessidade de reposicionar seus referenciais teóricos para refletir as realidades da Amazônia, por exemplo. Em suas palavras: “Reivindico a região não apenas como lugar de enunciação, mas como chão onde assentamos percepções e elaborações intelectuais e de onde nos inspiramos para desenvolver nossas pesquisas (…): falar a partir dos nossos centros”.

Além do descentramento regional, podemos reconhecer outras formas contra-hegemônicas de enunciação antropológica a partir de identidades, sexualidades, deficiências, alteridades cognitivas, deslocamentos disciplinares, temas que não ocupam lugares e espaços acadêmicos de maior visibilidade e notoriedade, configurando, de certa maneira “guetos epistemológicos”, “anarquistas”, “deslocados” no interior da própria disciplina. Seriam antropologias anti-disciplinares?

Inspirados por esses novos debates, propomos este Fórum com o intuito de reunir distintos modos de ser, viver e praticar a antropologia em outros “centros” e centros “outros”. Partimos da compreensão de que tudo o que tem se passado na periferia é vislumbre do futuro do que ocorrerá nos “centros” do presente. Estudos, reflexões e pesquisas realizadas desde – ou para – essas periferias (políticas, acadêmicas, epistemológicas,…) são bem vindas e contribuirão para refletirmos sobre a permeabilidade da antropologia à sua própria diversidade antropológica constitutiva! Ou seja, em que medida ela é efetivamente capaz de ser epistemologicamente inclusiva da alteridade de suas/seus próprias/os praticantes?

Cronograma

Prazo para recebimento de contribuições: 28 de fevereiro de 2024

Previsão de publicação: 15 de dezembro de 2024

Submissão

Contribuições devem ser submetidas através do formulário de submissão da revista, que pode ser acessado clicando aqui.